René Magritte - Retrato de Edward James
Teus Olhos no Espelho
Por que você existe se não posso sê-la?
Lascivos sonhos perdidos em acordes diurnos
Foi-se embora a concretude onírica
Ficou o desejo real
Ah, se eu me pudesse
Se eu pudesse ser-me
Eu seria tu
Olhar no espelho sempre
E mergulhar em ti
Uma traição bela
Um destino contido, mas sentido
Tua totalidade é proibida
Teus sonhos, incomunicáveis
Ah, se as palavras não fossem barreiras
Ah, se o verbo fosse ação
A emoção projetada
O sentido anômico
Não precisaríamos de dicionários
Ou salas de cinema
Dia dos namorados
Ou tardes de domingo
Seríamos apenas
Seríamos sós
Seríamos apenas nós
Sem verbo, sem nome, sem voz
Mas essa prolixidade temporal
(Quase tempestade)
Venta-me contra o destino
E o sem-fim do desamor
Corrói-me o fígado
Com seus beijos etílicos
E seus coitos sem filhos
Apaguem, apaguem, apaguem
Apaguem essa luz
Que cria tantas sombras
Apaguem tudo, apaguem todos
Deixem-nos sós
Apenas nós
Sem corpos, sem almas
Escuridão calma
Indiferenciação
Um beijo eterno, terno, lerdo
Apressado, sem tempo, lento
Apertado, sem espaço, infinito
Somo-nos
Enfim um fim
Universalmente abraçados
Singularidade
Teus olhos no espelho
Corporalmente desalmados
Espiritualmente descarnados
Não há eu ou você
Não somos sem sermo-nos
26/05/07
2 comentários:
Se sente desalmado, desama...
A foto nova do principal é linda!
Belíssimo poema... Singularmente singelo. Profundo é o momento em que a solidão inebria e inspira - quiçá libertador.
A con-fusão entre o eu e o outro é lampejo da con-fusão entre o eu e o Ser. Que buscamos, senão a unidade perdida?
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